...where the KiwiSDR (PY2-81502 SWL) is installed (behind the trees) - São Bernardo SP GG66rg, SE BRAZIL

18/09/2010

PERFIL: Marcelo Pera - Valinhos SP

Segmento voltado a radioescutas, DXistas e radioamadores que relatam sua trajetória no rádio, eles mesmos, em suas próprias palavras. A gratidão a estes, que gentilmente compartilham sua vida na radio-comunicação, estimulando a tantos outros que seguem o mesmo caminho.
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MARCELO PERA
Radioamador (PY2-AE), Radioescuta (SWL)


Bem... tudo começou lá pelos idos de 1977... Quando eu tinha 13 anos....me lembro muito bem que eu e uns amigos de colégio costumávamos brincar em um praça perto de casa ate que uma tarde após a aula, um amigo apareceu com um par de walkie-talkie de comunicação... e logo começamos a usá-lo e a brincar ate que de repente ele começou a falar sozinho... Mais tarde fui descobrir que ele trabalhava justamente no canal 13 da faixa do cidadão, que já naquela época era já uma febre no Brasil.

Após ficar escutando os papos naquela freqüência fui descobrindo um montão de coisas sobre radio, antenas, cabos, emissoras e também broadcasting....e ai o mundo do radio acabou se abrindo para mim...e fui contagiado pelo vírus da radiofreqüência e assim...ate hoje... virou uma paixão...mas ate do que um hobby.

Com aquele radinho de 0,5 watt de potencia, que utilizava uma bateria de 9 V, conheci um montão de gente, que me motivaram no hobby além de me emprestarem exemplares da revistas Eletrônica Popular e ai não teve mais jeito.. aos poucos fui descobrindo o universo da radiocomunicação ... e cada vez aprendendo mais ... Ate que tive acesso a um radio transistorizado de Ondas curtas do meu avô...em que eu passava horas a fio escutando as rádios broadcasting mais fortes, principalmente a Radio Moscou, a BBC, Radio Praga, e tantas outras que chegavam muito fortes... mesmo só utilizando um pedaço de fio como antena. Me lembro também que muitas vezes sintonizava idiomas estranhos para mim ate então ... e comecei a fazer minhas escutas ... compondo simples logs de recepção da minha maneira...mesmo sem saber de que lugar do mundo eram.

Meu pai vendo o interesse, apareceu em casa com um radio DELTA 120, e disse ... já que você gosta tanto de radio... vamos tirar um indicativo de radioamador e para isso necessitamos fazer uma prova no Dentel (hoje Anatel) ... Naquele mesmo momento fui atrás de apostila e surgiu meu primeiro problema, já eu nem RG e muito menos CIC (hoje CPF) tinha para poder a fazer a prova... e então após telefonemas para a LABRE SP, recebi uma permissão especial para fazer a prova de ingresso no Radioamadorismo com a certidão de nascimento. Em algumas semanas eu tinha recebido o indicativo de PY2UWJ, classe C na época, podendo falar em fonia somente na banda de 80 metros.

Instalamos uma dipolo no quintal que até atravessou o limite do terreno e comecei a escutar a banda de 80 metros à noite e fui aprendendo com as longas conversas que ali escutava. O tempo foi passando e logo chegou o dia do 1º QSO em 80 metros. Eu so tinha AM ....era uma tarde de sábado... sol a pino...a banda sempre ruidosa durante o dia...e fiz um CQ geral longo... muito longo... e nada... chamava e nada... ate que entendi que durante o dia era difícil falar nessa banda... mas insisti e acabei sendo contestado por um radioamador de São Bernardo – PY2UNF, Murillo... sobre quem infelizmente nunca mais ouvi falar... Ele foi na verdade meu padrinho de radio... e sempre que eu chamava nos 80 metros... la vinha ele e outras pessoas para me contestar e sempre dando dicas... Como este radio também escutava os 40 metros e também SSB ... e ai iniciei minhas escutas das rádios comercias, ditas broadcasting e me lembro bem que enquanto eu preenchia os QSL’s dos comunicados que eu fazia em 80 metros para enviar para a LABRE... eu ficava escutando as rádios internacionais que não eram poucas na época.

Ao mesmo tempo em que tirei indicativo de radioamador eu fiquei sócio da LABRE-SP, pois naquela época era compulsório... e me lembro que durante a realização de uma Festa do FIGO, evento muito tradicional na minha cidade, foi montada uma estação de PX e outra de PY, onde os operadores faziam demonstração de radio para a população e distribuição de QSL’s... e daquele jeito eu não saia mais de lá e ficava ajudando e fazendo contatos para distribuir QSL’s comemorativos para a RBR (rede brasileira de radioamadores), que eh como nos chamávamos na época... CQ RBR... etc... até que de repente... vários radioamadores do Brasil e da América do Sul contestavam, mesmo em AM nos 80 metros e comecei a entender que eu também podia fazer QSO’s com outros paises... e ai foi uma festa... numa noite fiz contatos com a Argentina, Uruguai, Peru e Chile... e foi uma diversão...não parei mais de fazer DX !!!!

Naquele momento eu nem imaginava que o interesse pelos idiomas iria me ajudar tanto na carreira profissional alguns anos mais tardes...me fazendo viajar pelo mundo todo. Muito devo tambem a radioamadores locais... são tantos... mas um foi especial e inclusive se tornou padrinho do meu casamento - PY2SW - Bruno Giopatto.

Um dia, também durante a realização da Festa do Figo de 1979, eu conheci um radioamador , PU2XOK – Paulo, que me mostrou o que era telegrafia e disse... se você não aprender CW nunca vai ser um radioamador completo sempre vai faltar algo... (Hoje já não é mais assim, felizmente) e ele me fez uma oferta... Eu te ensinarei CW e você vai aprender !!! Topei na hora e comecei a fazer umas aulinhas junto com um outro PX de Valinhos usando um batedor pica-pau e oscilador e depois num projeto de manipulador iâmbico... já que naquela época a Revista Eletrônica Popular ja tinha publicado um projetinho bem fácil e meu amigo montou com excelente resultado, sendo, acredito eu, o primeiro iâmbico da região...já que ninguém conhecia. Aprender CW foi fácil... eu naquela época com 15 anos... cabeça jovem e sem grandes preocupações devorava as letrinhas e o som e sempre confiava nos conselhos do Paulo – ¨CW é musica¨... Apenas pense no som...e memorize a musica e quando menos esperava já estava batendo e ouvindo o abecedário. Numa oportunidade fui visitar um amigo PX que morava perto de casa e logo ele me mostrou uns piados que o radio Somerkamp tinha la nos canais mais altos... mas eu logo falei... mas isso eh CW... e assim descobri a banda dos 10 metros que naquela época tinha a propagação escancarada.

Logo conectamos o fio da antena atrás do radio e viramos a chave para USB, peguei meu batedor com oscilador e fui logo fazendo um pequeno chamado geral....mesmo sem ter ainda pratica de CW pois ainda não tinha terminado o curso ... e quem me contesta ? ... UA3GT Vlad de Donetsk, antiga União Soviética... Me lembro bem da reação de qualquer iniciante... suor... frio... não entendia nada... de tão nervoso, apenas peguei as letras do indicativo dele e o nome, a muito custo.. e entendi que tinha que aprender rápido este tal de CW pois a coisa era boa mesmo e falava longe, mesmo usando aqueles 5 wattinhos do PX numa antena plano de terra com um quarto de onda...

Naquela época nem estacionária da antena nos sabíamos o que era... e já cheguei ate a presenciar amigos ligando cabos de TV como antenas achando que tava certo. Eu sabia que não podia e mal sabíamos que a ROE estava la em cima... e potencia que eh bom.... nada.. Mas mesmo assim... era só clamar e falávamos fácil. Assim comecei meu aprendizado no DX. Aos poucos fui trabalhando paises novos e exoticos com esse radinho ate que meu amigo me emprestou o radio para levar para casa um final de semana. Arrumei uma antena Ringo de 11 metros, coloquei na ponta de uma barra de 6 metros e encostei na parede. Aí foi só alegria...

Já no colégio técnico eu passada as tardes e noites fazendo DX e comecei a colecionar QSL’s e paises novos e fui crescendo...50 paises... 80... 100 paises.... até que um dia eu, juntamente com esse amigo fizemos uma antena doida que saiu na revista Eletrônica popular. Uma quadra cúbica de 2 elementos para 10/11 metros montada com tubos de PVC... Montei-a usando tubos de uma sucata e ai ficou um canhão. Era só apontar para a Europa e a coisa ia...e a noite vinha Japão, Indonésia, Austrália. e meu score foi aumentando... 150... 200 paises e minha caixa de correio vivia cheia ... porém a mesma nao durou muito... foram uns meses e o sol forte acabou por entorta-la. Quando ia na Labre em SP era só alegria... pois naquela época ainda se pagava muito bem os QSL’s.... Nossa que saudades eu tinha da propagação do inicio dos anos 80.... Sempre com 5 watts em 10 metros eu fazia a festa...Hoje a coisa ta bem diferente... é raro abrir a propagação nessa banda.

Meu pai, PY2UWM - Valdemar, vendo que a coisa no radio ia bem... e que o radio me segurava em casa sem aprontar, um dia apareceu com um KENWOOD TS130S... novinho... comprado de um amigo de Jundiaí... ai era covardia... 100 watts e a coisa ficou boa de vez...e fui melhorando minhas antenas com uma yagi e meu quintal tinha fios esticados para todos os lados... e minha mãe não agüentava mais aquele “pipipi” do CW que ecoava e irritava de madrugada afora....ate que arranjei um fone de ouvido também....e tudo sossegou !!!!

O tempo foi passando... eu terminei o colégio técnico e comecei a Faculdade de Engenharia Mecânica e logo comecei a trabalhar numa montadora de caminhões. Mesmo assim continuei desenvolvendo algumas antenas, rádios QRP’s, fontes, batedores e montagens experimentais, etc, somente como hobbista... Ainda me lembro que todos os anos tínhamos demonstração de radioamadorismo na tradicional Festa do Figo da minha cidade e muita gente de fora aparecia e assim ao longo dos anos fomos motivando muitos amigos a começar no radio. Porém devido a dificuldade de equipamentos e exames o balanço é pobre pois poucos permanecem ate hoje ativos...

Continuei investindo no radioamadorismo e fui aprendendo cada vez mais e progressivamente meu score de paises trabalhados e confirmados aumentava... já beirando os 300... e me faltavam as figurinhas que nunca apareciam...naquele tempo não tínhamos internet... e era tudo no osso... caçava, escutava... identificava.. chamava... e trabalhava... Fui mudando de classe e logo cheguei na Classe A, onde adquiri o indicativo PY2AE, o qual tenho até hoje. Me tornei tambem assiduo em contestes e virara finais de semana faszendo contato na busca de multiplicadores e pontos... muitos cheguei a ganhar.... mas hoje mudou muito. !

Logo chegava novo ciclo solar da década de 90. A propagação estava numa fasse muito boa e me lembro que numa noite apareceu uma estação da Ilha de Heard - VKO, pertencente a Austrália no Oceano pacifico sul... meio caminho para a Antártida e fiz uma chamada em 40 metros com uma antena dipolo de meia onda e fui imediatamente contestado... bem... esse lugar eh tao raro e dificil.... que nem acreditei quando recebi a reportagem de sinal 58... Um tempo depois chegou o QSL e até hoje nunca mais houve outra expedição para esta remota ilha. Foram inúmeros os DX’s que ficaram na memória além de muitos causos de rádio e sempre que eu podia ficava atento aos boletins internacionais de DX na busca das figurinhas raras.

Ainda na década de 90 tive uma mudança profissional muito importante na minha vida pois dentro da mesma empresa tive oportunidade de ir para o Depto de Assistência Técnica e assim comecei a viajar pelo mundo principalmente pelos paises em desenvolvimento da África, Ásia e Oriente Médio.

Muitas vezes la ia eu bater na porta de radioamadores com quem já tinha falado anteriormente e assim fazia mais amizades, sempre sendo recebido com muito carinho. Não me esqueço do Osita 5N4NMT de Enugu, lá no sertão da Nigéria.... um calor imenso no meio da savana... e eis que eu consegui encontrar a casa dele devido as antenas, pois todos na região o conheciam. Acabei fazendo uma grande amizade e sempre que passava por lá era recebido com alegria, parando para dar um abraço no amigo e mesmo levar umas revistas de rádio ... historia como essa são muitas.

Ao mesmo tempo fui colecionando escutas de rádios broadcasting, sendo que o meu segmento favorito de escuta e minha paixão sempre foram as ondas Tropicais, ou seja, escutas de 2 a 6 MHz. Essa região do espectro eh ruidosa e de propagacao imprevisível... mas muito milagrosa sazonal e ate hoje é a banda que mais dedico meu tempo em OC. Nunca um dia eh igual ao outro, ou seja hoje você escuta uma estação forte numa determinada frequencia, mas amanhã você pode voltar no mesmo horário e na mesma estação e o sinal pode estar bem diferente ou simplesmente não aparecer sinal... ou seja... não tem muita explicação... depende realmente da propagação para fazer os pequenos sinais chegarem.

Uns anos atrás cheguei até a montar uma antena long wire para 160 metros... só para tentar escutar umas rádios Australianas e da Papua Nova Guine em OT cujos relatos de escuta na madrugada eram bons, mas até hoje nunca consegui... Fico admirado quando vejo logs de amigos com escutas de Ondas Tropicais contendo estações da Oceania e Ásia, pois sei quanta pesquisa e dedicação isso exige.... mas um dia vai chegar minha hora...

Hoje, 32 anos já se passaram desde meu inicio no mundo do radio e muita coisa aconteceu....nesse tempo fiquei remido da Labre/SP, participei de muitos eventos, conquistei muitas amizades e em matéria de DX só me faltam 2 paises para fechar o Top Honor Roll do DXCC Mundial totalizando o máximo de paises ativos num total de 338. Ainda me faltam Navassa e Crozet, duas ilhas desabitadas e remotas que dependem de expedições...mas não tenho pressa... um dia elas ainda aparecerão.

Bem... eh isso que eu queria contar nestas poucas linhas e espero que minhas memórias entusiasmem alguém a entrar no fascinante universo da radiocomunicação... que agora já está indo para o campo digital e da recepção DRM.. mas isso eh uma outra história. Abraços a todos....

Marcelo Pera PY2AE - Valinhos SP
15.09.2010

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